10 janeiro 2007

93...

Acabaram-se as Festas! Ufa finalmente!
Chegou ao fim a época mais estúpida e hipócrita do ano.

E dei mais uns dias de descanso a estas notas, pois poderia ainda escrever algo menos apropriado para esta quadra que se quer de Paz.

O meu telefone deixou finalmente de anunciar aquelas curtas mensagens escritas, cheias de amor e carinho, enviadas por aqueles que para nós só existem nas agendas esquecidas nas memórias dos aparelhos.

O comércio já acusa a falta da clientela rafeira, que enche os centros comerciais durante três semanas inteiras e ainda pergunta porque é que as lojas não estão abertas até à meia-noite do dia 24.
Grandes autocolantes e cartazes anunciam nas montras as Promoções e Saldos.

Afogados nas contas, nos rios de dinheiro que se gastaram nestes dias festivos, Janeiro é um mês duro e longo. E ainda se seguem Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro antes de um novo Dezembro.

Já houve tempos em que eu gostava da quadra natalícia.
Vibrava com a antecipação de uma mesa cheia, de comida e de gente, enquanto polvilhava os sonhos e filhoses, com açúcar e canela, que a minha avó fritava durante horas a fio.
Ao redor do bacalhau e das couves da consoada, a excitação que se começava a elevar, era alimentada também pelos sorrisos mais rasgados e risos mais altos do que habitualmente.
Terminada a sobremesa os minutos até às doze badaladas eram sempre tão compridos que fazia por comer devagar ou continuar a saborear outras iguarias.

Mas isso era antes... antes de crescer.

Depois veio a constatação de que o Natal é só para alguns poucos felizardos.
Que a esmagadora maioria do mundo não recebe um presente.
Veio a noção de que os valores que se pregam nestas datas são esquecidos durante o resto do ano.
Que a sociedade está mergulhada num sentimento consumista e que se consome a si própria.
As tradições perder-se-ão. Dentro em breve não serão mais que resquícios nos livros de contos.

Antes sorria, com compaixão, quando lia o conto “Natal” do Torga.
Este ano, quando o procurei nas prateleiras da estante e reli, dos meus olhos escorreram lágrimas de uma pura tristeza reconfortante.
Não é pela minha formação católica que me revejo naquele conto, mas sim pelos valores que o meu juízo filtrou como válidos e que defendo com a minha honra.
Filtros de alguma lógica e bom-senso que devo à família.

A família também se renova, as gerações sucedem-se.
Talvez um dia o meu entusiasmo renasça das cinzas e voe como a Fénix, nos rostos e corações dos mais novos que hão-de vir.
Passarei o testemunho!

A felicidade está e estará sempre nas coisas simples.

Nota nostálgica esta, afirmarão vocês com toda a convicção.
Terão razão.

Como eu disse a família renova-se.
Com esta nota, a primeira presa em 2007, assinalo a morte da Vó Xandrina.
Para mim, ela representará sempre mais que os outros a quem fiz referência neste bloco de notas. Se fui capaz de assinalar outras efemérides necrológicas, algumas tecendo largos elogios, por uma questão de coerência terei de perpetuar, aqui também, a memória da minha avó.

Vó Xandrina
Alexandrina dos Prazeres, senhora dos seus 93 aninhos, não acreditava que o Homem tinha caminhado na Lua mas acreditava em nós, nas três gerações que gerou e criou.
Fico apenas chateado por ela me ter faltado à promessa de esperar pela quinta geração da família.
Sei que tenho a minha cota parte de responsabilidade nesse aspecto e que há limites que nos são impostos pela Natureza.
Por isso afirmo que aqueles que serão nados saberão quem ela foi, o que fez, o que disse.
Saberão também quem foram os outros de quem serão descendência.
Há coisas que têm de ser preservadas.

E assim começa 2007. Como 2006 terminou.
Gente a nascer e gente a morrer...
Celebre-se a vida.
Com mais entusiasmo e sentimento que o Natal.


Pequena nota:
Para quem não conhece "Natal", procure-o nos "Novos Contos da Montanha" de Miguel Torga.

1 Anotação:

Anónimo anotou...

Fogo, meu...

À Vó Xandrina, Hip, Hip....