20 outubro 2011

Nuvens

O tempo passa a correr.
Deste ano, em particular, só vejo paisagem desfocada a passar a uma velocidade estonteante.

Para conseguir que o meu cérebro processe, minimamente e sem gripar, tudo o que os meus cinco sentidos, na vertigem da saturação, absorveram nestes últimos meses, tenho recorrido a auxiliares de memória...
Auxiliares de memória, é o nome pomposo que um professor meu utilizava para cábulas.

Se antes usava ficheiros de texto, agora virei-me para o software especializado que funciona até no meu telemóvel, mantendo as minhas notas acessíveis em qualquer lado e permitindo pesquisas detalhadas.
Mas claro que continuo a usar um bloco de notas... todo escrevinhado, numa caligrafia muitas vezes ilegível e ao qual falta uma ferramenta de pesquisa.
Tenho uma desorganização inata, que se reflecte nas minhas notas, e que dificulta encontrar seja o que for que tenha escrito. Como sei disso às vezes não escrevo... e esqueço-me... outras escrevo e não encontro... por isso esqueço-me na mesma.

Mas agora é impossível esquecer! Se durante as últimas décadas foi porque as memórias de silício dopado se insinuaram nas nossas vidas, tão discretamente que nos habituámos a depender delas, agora é a rede que se torna na nuvem onde tudo se perde mas nada se esquece.
As minhas notas guardadas algures, em servidores espalhados pelo mundo, provavelmente replicadas em cópias de segurança efectuadas diária e automaticamente, correm o risco de existir até ao fim dos tempos, em zeros e uns no ciberespaço... mesmo que ninguém alguma vez as leia e mesmo que eu me esqueça de que elas existem.

E se isto se passa com as minhas notas... que serão porventura irrelevantes, imaginem o que acontece com tudo o que mandamos para essa nuvem que cresce desmesuradamente, alimentada por essas partículas de informação.
Fotografias das férias, vídeos dos miúdos, correspondência... e tantas outras coisas... ficheiros e ficheiros.
As nossas vidas estão cada vez mais ligadas e por isso cada vez menos anónimas, ou menos privadas... é a ubiquidade, estamos em todo o lado ao mesmo tempo... e todos nos vêem.

Há quem não tenha pudor e não se importe com isso... quem abrace a nuvem e acelere pelo nevoeiro sem luzes ou sirenes.

Eu trepo na térmica que é a Internet até à nuvem que ela criou e ameaça sobre desenvolver-se(1).. mas fico sempre com algum receio... afinal quem controla as nuvens?
O clima até está cada vez mais estranho com esta coisa do aquecimento global... E previsões meteorológicas têm sempre um grau de incerteza.

Não era sobre nada disto que eu queria escrever... mas agora também já não me lembro exactamente qual devia ser o tema... tenho de rever as minhas notas...


(1) Nota voadora: as nuvens mais comuns são os cumulus humilis, os pompons que pululam por aí. Estes formam-se por correntes de ar ascendente, térmicas. Ar que ao subir arrefece até condensar a humidade que possui, formando a nuvem. Se o gradiente de temperatura permitir este ar mais quente continuará a subir e a gerar uma nuvem maior... cumulus congestus... e maior... cumulus nimbus... até se desfazer tudo em trovoada, raios, coriscos e uma chuvada.